sexta-feira, 12 de agosto de 2011


O Tempo do Concerto 














(Desenho de Lívia Portela)



Após executar por repetidas vezes uma peça de Franz Liszt, interrompido apenas pelos tragos, goles e intervalos compostos por um fio de vento que reduzia o candelabro a peso de partituras, deixando o maestro sem fósforos para os cigarros, pousou suas mãos suavemente sobre as teclas do piano, relaxou os ombros, e com um olhar flutuante sobre o ambiente, feito uma grua num filme de Bergman, concluiu:

- O tempo do concerto é o tempo das velas. E a dança das chamas sobre o piano é a mesma, de horas contadas, da alegórica sombra do concertista, de horas contadas, sobre os móveis cansados de desuso, de horas contadas.

Vendado de lágrimas, levantou-se e partiu para porta com braços de tentáculos, pegando tudo que precisaria: casaco, caneta e chave, e saiu visitando todos os bares da cidade, dos luxuosos salões de horas contadas aos botecos de homens e mulheres muito simpáticos, de voluptuosas horas, até a praça, das horas eternas, onde sentou para conversar com a Lua. Falou-lhe de seus planos, dentre eles, deixar a noite, como um caleidoscópio estelar que se estende no infinito do firmamento até apagar-se em resistência. Depois de inúmeras horas que se dividiram entre noite e dia, ela se recolheu.



- JC, 13/ago/2011, 03:28 -

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